Aos setenta e quatro anos ela acordou se sentindo velha.
Até ontem não havia percebido que aquelas dores nas pernas não eram passageiras.
Até ontem ela acreditava que a dor nas pernas era por conta das escadas. Ah, quantas escadas, por toda parte.
O alongamento diário parecia não mais fazer efeito, diante de tantas escadas.
E as escadas nem pareciam tantas, quanto o falecido comprou aquele sobrado.
Mas naquele dia, quando olhou no espelho se deu conta de que a pele já perdera o frescor da mocidade, os cabelos mal cobertos pela tinta, já eram ralos, sem brilho...
Naquela manhã se deu conta de que sua mão já não tinha a mesma agilidade e firmeza. E ela não havia tomado sua taça de vinho.
Sentou-se na velha poltrona do quarto, e ficou horas olhando a copa das árvores.
Lembrou-se de como aquela paisagem lhe alimentou por tantos anos,
De quantas vezes sua alma só encontrou calma no verde das folhas em contraste com o azul do céu.
Lembrou-se de como, anos antes, ali naquela mesma poltrona ela alimentou seu filho, e antes ainda, ali também amara seu único homem.
E o amara muito e de diversas formas por diversas vezes. Tantas e incontáveis vezes.
Durante toda aquela manhã ela tentou se lembrar de quando havia envelhecido e nem percebera.
Sim, as rugas já estavam lá há muito tempo, disto ela sabia, pois já lhe davam lugar nos coletivos há pelo menos uma década e meia.
Mas aquela canseira... Aquele enfado... Aquele medo de descer as escadas e descobrir que não conseguiria subir novamente...
Aquilo era novidade.
Aos setenta e quatro anos ele resolveu então, ter amnésia.
Colocou um moletom, camiseta com foto do Raul, um tenis no pé...Daqueles sem cadarço,
Passou batom, escolheu um anel bonito e um enfeite pro cabelo.
Desceu as escadas lentamente...
Antes de sair, jurou que iria mudar seu quarto pro andar de baixo.
Afinal, aquelas escadas estavam acabando com suas pernas!!!
Quando crescer
Há 5 meses
Nenhum comentário:
Postar um comentário