sexta-feira, 30 de novembro de 2012

37, e ainda é primavera.


Todo ano escrevo alguma coisa especifica sobre meu aniversário.
Faço anos, já os fiz antes e continuarei fazendo.
Não há nada novo para ser dito sobre isto.
Para quem tem a primavera como berço todo o resto fica pequeno.
Nascer na primavera é poder completa-las eternamente.
É gostar de cada ruga e só não aprovar os cabelos brancos.
Nascer na primavera é permitir-se reaprender a viver.
Feliz dia para mim

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Deste feriado eu só quero as cores.


Deste feriado eu quero mais que os dias.

Eu quero a cor e a poesia que sei existir dentro de mim.

Deste feriado eu quero a inspiração que parece ter sido tomada de mim. Deste feriado eu quero a minha força, aliada ao que preciso para manter minha calma.

Deste feriado eu não quero o sono apenas.
Eu quero as noites bem dormidas e os dias bem claros, bem vividos.
Da vida eu quero pouco.
Quero apenas vivê-la na plenitude do que sei ser capaz.

Sei o que posso e ningúem, além de mim, pode tirar-me isto.

Deste feriado eu quero as cores do meus vasos, vasos que pinto pelo jardim de minha casa.
Quero o silêncio dos que gostam da própria companhia e uma boa música, brasileira de preferencia, tocando na vitrola.
Quero muito, dirão alguns. Eu digo que quero o que posso.
Beijos e bom feriado a todos.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Charles Chaplin e outras conversas.



Meus ídolos estão vivos e o acesso às artes em Guaianases???

Todos na esfera virtual já sabem que sou fã (nática) pelo Raul Seixas além de ser fã (muito) do Zé Geraldo. Sou Zégeraldiana e todos por aqui sabem disto.

Sabem que na parede do meu quarto havia diversos quadros com fotos do Raul.
Por sorte ao contrário de muitos eu não posso me gabar e dizer “meu ídolos morreram”. Tenho dezenas de ídolos muito vivos, caminhando pela terra, alguns deles bem ao meu lado. Outros caminham já noutras esferas, todavia permanecem vivos, em mim.

Idolo, é todo ser que foge da esfera medíocre, da simples existência. Eu vivo cercada de gente assim.

Os que morreram ainda vivem em sua arte, e é aqui que entra a novidade do dia: poucas pessoas sabem que também sou fã (nática) do Charles Chaplin.

Pois é. Sou. Sou fã do Charles Chaplin, cineastra, ator, diretor e sobretudo gente. 'Raçudo' como só ele soube ser. Vagabundo? Não, o bicho tinha pedigree, não tenho dúvidas sobre isto.

Na mesma parede repleta de fotos do Raul, havia no centro de todos os quatros um, que peguei do quarto do meu irmão, quando ele mudou-se, e coloquei isto aos (+ ou -) 15 anos de idade, um quadro com a foto do Chaplin, ou melhor do Carlitos, personagem celebre de “O Grande Ditador”.
Sou fã da arte em todas as suas expressões.

O cinema é outra forma de arte que sempre me absorveu e que infelizmente, assim como o teatro, é reservado para poucos.
Guaianases não tem cinema. Pior do que não ter Shopping meu bairro não ter um teatro e um cinema.

Pois é. É desta maneira que querem nos incluir ao todo, negando-nos as formas mais elementares de acesso a cultura.
Enfim...bora mudar de assunto que é pro estomago não embrulhar.
Deixo aqui uma citação do artista, do homem, do mito, da lenda viva Charles Chaplin:

“Nada é tão belo a ponto de fazer as pessoas se esquecerem de seus ovos e bacon no café da manhã; quanto à admiração do mundo, isso vale nada, pois no final só há você mesmo a agradar: você faz tudo aquilo porque significa algo para você. Traballha porque tem uma superabundância de energia vital. Descobre que, além de fazer filhos, também pode se expressar de outros modos. No fim, é você – só você -, seu trabalho, seu pensamento, sua concepção do belo, sua felicidade, sua satisfação. Seja corajoso o bastante para encarar o véu e leventá-lo, e veja e conheça o vazio que ele esconde, e fique diante deste vazio e saiba que dentro de você está o seu mundo...”Charles Chaplin - 1922

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Pulso


Hoje eu sonhei que te beijava.
Te beijava e você andava comigo de mãos dadas, tua mão segurava a minha e seus dedos tocavam meu pulso.

Soltei tua mão, envergonhada, quando alguém apareceu no caminho.
Sorri, pisquei.

“Prometo que serei tua.”

Seus olhos grandes piscaram de volta.
Teus olhos sempre procurando algo em mim.
Sua língua sempre passando pelos lábios. Seus braços cruzados, e eu falando.

Acordei sentindo o seu beijo e passei toda a manhã com o calor dos seus dedos no meu pulso.


quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Errante.


Quando o pensador; ou mero pensante, tolo e teimoso; sofre, emana força.
Ainda que muitas vezes a luz se reflita em cores escuras, no pântanos e no lodo
O reflexo é luz.
Seu sangue, suas lágrimas, seu suor: tudo transforma-se em arte.
O seu grito, seu sussurro, o seu medo, sua pálida secura, o desespero dos insones: é ali que a arte se consuma.

Na dor, na eterna dor dos que não são amados, no desespero dos que foram abandonados, na fome que sente-se ao sentar-se a mesa, ou no desassossego febril no olho do passante, viciado, doente.
É ali, naquela miséria que nasce a flor, linda, amarela, do meu quadro favorito.

Nas vestes rotas que já colocou sobre a pele, no chinelo podre que quebrou quando ia para a escola, no vestido que usou, e se pensou linda, e na verdade era só era uma camisa velha amarrada com barbante...é nestas lembranças que a moça compõe sua mais doce balada.

É na dor miserável que come o cérebro, das lembranças tenebrosas de uma infância maldita, que o cronista compõe a sua escrita..

É na dor, na insônia, na fome, na ruptura da pele lisa, na boca aberta e seca.
É ali, também, que nasce minha poesia...
Retalhada e feia.
Mal escrita, mal pontuada,sem acentos, mal descrita.
Feia. Mas minha.
Errada, errante, vomito.
Mas minha.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Prudência...e medo.



Prudência e chá de camomila não fazem mal a ninguém.
Sei disto.
Porém prudência em nossa sociedade é sinônimo de medo.
Não basta ser prudente. É necessário tornamo-nos prisioneiros do medo.
Ser prudente é ter grades nas janelas e não andar a noite.
Somos prisioneiros ou cumprimos regime semi-aberto.

Somos assaltados e nos sentimos culpados por isto.
Mas a culpa é sempre nossa?
Somos culpados por sermos bandidos e culpados por não sermos.
Ser bandido não é mais sinônimo de infância pobre.
Não é o dinheiro que temos que compra o caráter dos nossos filhos.
E sempre somos culpados.

Se reagirmos somos culpados pelo tiro que nos mata, ou pela morte de alguém que não teve escolha ou não soube escolher.

Se não reagimos somos culpados por termos sido roubados.
Somos culpados por perder os bens que compramos a duras penas.
Somos culpados por vermos roubado o celular que nem pagamos.
Somos culpados por nos expor ao perigo, afinal, é imprudente querer gozar do nosso direito de ir e vir.

Somos fruto de uma sociedade corrupta e que sendo corrupta nos corrompe.

São 04h35 da manhã.
Acabo de deixar minha filha em seu quarto para dormir.
Assustada, tremendo, com medo.
Tive de, praticamente, colocá-la em meus braços e cantar para ela como eu fazia quando ela era só um bebê.
Não sei cantar, não consigo colocar a letra na música certa...então inventava minhas próprias canções e a embalava para dormir.
Fiz isto até ela se acalmar.

Ela foi assaltada, ao que me lembro, 04 vezes. 02 delas no ultimo trimestre.
Duas vezes no meio de uma singela tarde de sol.
Roubada. Intimidada. Amedrontada. Roubada a luz do dia, nas ruas do bairro onde mora.
A penúltima vez, ás 19h, horário de verão. A luz clara ainda,em uma rua movimentada dos arredores de uma das maiores estações da CPTM de São Paulo, com um fluxo de centenas de milhares de pessoas por dia.
Foi jogada no chão na tentativa de tirar o tênis.
Sua sorte foram os “guardinhas” da estação que correram e apitaram até que os bandidos fugiram.

A última vez foi ontem.
1h30 da madrugada.
Ah, agora sim. Agora foi culpa dela!
Pois é.
Mas não.
Em uma sociedade ideal uma jovem, acompanhada do seu namorado de 19 anos, pode pegar a última sessão do cinema, em um shopping movimentado, e ao final da sessão pegar um taxi para ir para casa.
Na zona leste de São Paulo não.
Ontem deu errado.
Saiu da plataforma principal do metrô Itaquera, rumo ao ponto de táxi que beira a Radial Leste.
Ela e o namorado foram encurralados, amedrontados e roubados.
Ela em pânico temeu pela vida dele. E em pânico ficou.
Desta vez podiam roubar mais que um bem.
Podiam roubar-lhe a vida, a vida de quem ela gosta.
E a culpa?
A culpa é deles, claro.
Afinal quem manda querer ir a última sessão do cinema.?

Em uma sociedade ideal as pessoas não podem ser assaltadas a luz do dia.
Em uma sociedade ideal as pessoas não podem ser jogadas no chão em ruas movimentas.
Em uma sociedade ideal as pessoas estão seguras ao ir a um shopping, ver a última sessão de um cinema e sentir-se-ão protegidas ao caminhar, até um ponto de táxi. (sobre a passarela principal de uma das maiores estações de metrô da zona leste, onde será o primeiro jogo da Copa do Mundo em 2014).
Mas, não moramos em uma sociedade ideal e quem não se aprisiona é culpado por ir e vir.
Em qualquer horário.

(Filha, não permita que o medo de faça prisioneira. Você não tem culpa por acreditar que vive em uma sociedade livre. Te amo.)

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Inteira.



Bem, o blog se chama "eu, todos os dias". Isto significa que a casa é minha. Significa também que não estou muito preocupada em falar só de paixão, politica, arroz com feijão ou o que vier.
Tem dias que escrevo poesias pras minhas amigas, e o desejo delas é o meu.
Tem dias que conto a prosa que vejo no olho do moço e ele não sabe dizer.
Tem dias que só digo eu te amo, pro amor que deita comigo.
Mas hoje...hoje. Hoje vou dizer a quem amo, que simplesmente não quero mais.
É isto ai.
Faz parte. Não quero mais que vocês me façam mal. (e leiam o plural da frase antes de darem nomes aos bois).

Lá vai:

Inteira.

"Eu não sei ser rasa e este é meu maior defeito.
Mas algumas pessoas, ás vezes algumas das que mais amamos, não podem sair do nível raso de nossas relações.
Elas fazem por merecer o raso de nossas vidas.

Por mais que a amemos, nunca nada do que fizermos será suficientemente bom para que elas sejam capazes de demonstrar que se orgulham. Que está bom.
Tudo, todos os nossos esforços, todos os diálogos, todos os abraços, todas as conversas, todas as tentativas de aproximação sempre resultarão em criticas.

Algumas pessoas simplesmente não sabem receber o amor sem mágoas.
Elas são incapazes de compreender que você as ama apesar de todas as mesquinharias que elas insistem em cometer durante toda a vida.

Elas são egoístas demais para enxergar algo além da própria conveniência.

Amar as vezes é dizer não.
Não quero vocês em minha vida exatamente por que amo.
Amar vocês me faz mal."

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Bom dia.




Estou pouco me lixando pro seu conceito do que é política. O meu é este.
Consciência. Dignidade. Comprometimento ao menos com a própria consciência.
Não sou filiada a nenhum partido politico. Ainda não sei em quem vou votar. Ah, e devo avisar que não pretendo me filiar a nenhum. Mas não vendo minha consciência.
Não calo a única coisa de realmente minha, eu, que nada tenho de meu.
Só tenho minha voz, e às vezes nem isto.

Estou com nojo e vergonha de ser paulista. Não pela minha São Paulo, mas pelo que se vê pelas ruas.
Não tenho nojo da sujeira, nem das pessoas que vagam, tenho nojo do que tem sido feito pra esconder isto.

Desesperança.

Ler "Paixão Pagu"(edt Agir) fez-me lembrar de meu Pai.
A decepção dela lembrou-me o semblante de meu Pai quando voltou de CUBA.
O sonho dele era conhecer Cuba.

Conseguiu isto através de sua doença. 80% do corpo tomado pela psoríase. A tia pagou a viagem para tratar, em 1998.
Quando voltou a decepção era latente.
Nunca mais ouvi ele falando de Cuba.

"Então a revolução se fez para isto" (pergunta feita por Pagu na página 150 do livro que é sua autobiografia precoce) é a pergunta que eu via nos olhos de meu pai.
É a pergunta que eu me faço sempre.
Esta coisa de largar tudo pela causa. Virar mito, e no entanto, a decepção, profunda.

Enfim...eu ainda acredito na transformação.
Acredito no poder que o conhecimento dá a uma pessoa.
Poder de escolha, que muitos não tem.
O direito a educação de qualidade, que ultrapasse os limites culturais, direito a oportunidade. Acredito apenas nisto.
Acredito que apenas ensinar a pescar é ridículo se você não der o acesso ao lago, ao rio, ao mar. SE não der também a primeira vara, a primeira rede.
Ensine alguém a pescar e lhe dê o deserto. Me diga que peixe esta criatura irá pegar???

Enfim, isto tudo ai é um bom dia.
Desculpe o mal jeito. Eu nem acordei ainda.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Recuso-me

O barulho das paredes cai sobre mim.
Não, as paredes não caem, o barulho cai e me enterra embaixo dos seus pedregulhos.
Pedregulhos de vozes que gritam, de carros, de venenos destilados.
São pedras enormes de um barulho repugnante.
O barulho causa náuseas.

As paredes estão frias, o chão está frio.
O chão, embaixo dos meus pés sem meias, está tão frio que eu penso ser de gelo.
De gelo também é o ar e as pontas dos meus dedos.
Lá fora posso ver as poucas árvores que restaram no terreno em frente de casa...construções mal feitas, gente que passa sem olhar para os lados.

Fecho as janelas, todas, fecho também as portas.
Fecho a casa toda para reter o calor e deter o barulho.
Apago as luzes para que ninguém saiba de mim.

Entrego-me ao silêncio, ao calor. Com a casa toda fechada consigo reter calor.
Acendo a luz, novamente. Só uma.
Conto todas as contas do meu colar, todas as conchas do meu tesouro.
Leio todas as revistas velhas, relidas muitas vezes.
Releio o livro que gosto.
Evito escrever. Escrever traria a tona todos os meus fantasmas.
Aos poucos o frio dos meus dedos vai desaparecendo.
O chão derrete seu gelo embaixo dos meus pés.
O silêncio, maravilhoso, aquece minha pele, desce por minha coluna, retira toda dor.

Só não posso abrir as janelas.
As portas, elas precisam estar sempre fechadas.
E as luzes, apagadas.
Deixo só uma lâmpada acessa.
Só para te enxergar ao meu lado.
Você e minha única certeza, minha única verdade.
Lá fora, o mundo de gelo e barulho devora minha existência.
As luzes sempre apagadas me escondem de mim. Cá dentro eu me enterro, me nego, me recuso.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Vem...

(Os rabiscos abaixo deviam ser trechos de uma música...Sairam de dentro de mim em forma de canção, no calçadão. Sabe como é? Daquelas cantorias bobas, pra receber a tarde???
Pois é...são só rabiscos bobos, mas toda sexta-feira merece uns instantes de bobeira.)


Larga mão de ser tão sério e vem.
Se você quiser, eu quero.
Larga tudo e vem.
Se você me olha eu mostro, se você me beijar eu beijo se você me chamar eu vou.
Deixa tudo pra lá, e vem.
Se quiser falar, eu ouço,
Dou meu ouvido para teus ais e minha boca para sentir teus sais.
Ah, se você quer brinquedo eu brinco,
Se você quer chamego eu dengo, larga tudo e vem.
Ah...larga de ser assim tão certo, erra tudo e vem...

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Avesso

O avesso de minha vida é o meu medo.
O nada, este escuro infinito,
A finitude dos corpos e o cheiro de barro.
O cheiro de barro, de lama. E a chuva que não para, dentro de mim.
Este avesso que revela a costura mal feita, o rasgo, o talho em um tecido que parecia tão belo.
O momento em que a linha e o pano se confundem, no avesso.
É neste avesso que moro, que sou, que me desconheço.
Neste avesso que não entrego, que nego, que escondo.
E é ele que complica tudo.
Neste avesso em que me perdi, não sei revelar o que fui.
Sei que estive lá, que de lá fugi e hoje não sei voltar.
Meu medo, meu grande medo, é voltar pra lá sem perceber.
No avesso desta que hoje sou está escondida a linha que desmancha toda minha vida.
No avesso de mim, mora alguém que não conheço...

segunda-feira, 2 de abril de 2012

O Espirro do anjo

Este texto foi publicado originalmente no blog "Aspirinas e Urubus"...http://aspirinasurubus.blogspot.com.br/2011/06/o-espirro-do-anjo.html
percebi hoje que tenho vários textos lá que não publiquei aqui...acho que vou trazê-los todos para cá...
começo por este, em homenagem a um amigo querido.


O Espirro do anjo.

Hoje, ao sair de casa, pude por alguns minutos observar meu vizinho pintando as grades do portão de sua casa.
Casa onde mora com sua esposa e seu filho caçula.
Enquanto eu o olhava minha mente foi inundada por recordações de uma infância que parece ficar cada vez mais remota.
A casa dele, assim como é a minha, pertence a sua família a mais de três décadas.
Faz tanto tempo... Mas olhando-o lembro que já fui criança um dia.
O mandamento de me tornar como uma criancinha ou não verei o reino dos céus parece ter sido esquecido por mim há muito tempo.

Olhando-o lembrei de alguns poucos dias nos quais eu ser uma criança não era feio.
Sim, pois tem pais que ‘teimam’ em criar seus filhos não para serem adultos honrados, mas como se já fossem adultos.

Olhando meu vizinho hoje cedo eu me lembrei – me do pai dele: Senhor Vicente...
‘Seu Vicente’, para os íntimos, o caminhoneiro da ‘cegonha’.
Todos que moram a mais de 20 anos na Rua ‘da Biquinha’ lembram dele, posso apostar.

Caminhoneiro por profissão ele se ausentava por longos meses.
Mas se existe algo que ficou em minhas memórias de infância são os gritos de alegria dos seus filhos quando entre uma e outra carga ele ficava algum tempo em casa.

Lembro-me de em uma noite fria; ao menos em minha memória aquela noite foi mais fria do que as outras e a solidão infantil doeu mais no meu peito; pois bem na tal noite fria, que não posso datar tanto tantos são os anos que de lá pra cá se foram, mas arrisco que eu devia ter no máximo 6 anos, portanto lá se vão 30 anos, na tal noite o caminhão dele ‘pousou’ em nossa porta, explodindo com seu ‘barulhão’.
.As crianças, meus saudosos amiguinhos de infância, desceram por seu longo quintal gritando:
Pápa!! Pápa!!!Pápa!!!Pápa!!!Pápa!!!Pápa!!! (Os filhos os chamavam de Pápa, sem o ‘i’ no fim, se sobre o frio não posso dar certeza, isto eu afirmo!)
Ouvi os passos rápidos deles no corredor ao lado de meu quarto e depois só a bagunça de gritos e muitas risadas.
A alegria deles com a chegada do pai foi algo que nunca esqueci.

E o ‘Seu’ Vicente mudava meus dias também.
Os espirros dele são lendários.
Até hoje tento imitá-lo.
Eram daqueles espirros de fazer gosto, bem altos, bem molhados, espirros dado por gente que não tem medo de ser feliz.
Depois, às seis da manhã, ele colocava o “bichão” pra aquecer o motor.
Eu ouvia os meninos mais velhos dele o ajudando com o caminhão.
Aquele ruído logo cedo não incomodava.
Eram ruídos de crianças felizes.

Não sei que tipo de pai ele foi.
Não sei se seus filhos têm dele boas ou más recordações.
Mas sei que em mim ele deixou doces recordações de infância.
Lembro que ele organizava competições entre as crianças na rua.
Competição de corrida pelo quarteirão.
‘Seu Vicente’ dava dinheiro a quem ganhasse e doces para todo mundo.

Estas eram uma das poucas vezes que eu me permitia competir.
Nunca gostei de esporte de competição.
Meu fôlego sempre faltava e eu ficava envergonhada por perder.
Mas com o ‘Seu’ Vicente por perto não era assim.
Ele chutava para longe minha vergonha de ser criança.
Ele nos empurrava e dizia: “Vamos menina, vamos, é só uma brincadeira!”

Ele construiu pouco a pouco a casa que deixou para os filhos, durante a construção com a chegada dos blocos, das pedras e areia, ele pagava a molecada para carregarmos bloco, areia, pedra, quintal acima.
E fazia isto de um jeito tão divertido que nem notávamos que ele estava nos ensinando o valor do trabalho!
Outra lembrança boa: as moedas que ganhei carregando os blocos da construção da casa do ‘Seu’ Vicente renderam bons lanches de “pão-com-ovo” que eu comia me lambendo, seguida por minha mãe e irmã do meio.
E renderam também muitos chocolates que tinham um sabor melhor pois eram comprados com meu dinheiro!
‘Seu’ Vicente em casa era certeza de fartura até para os vizinhos.

Ele se parecia com um anjo moreno.
Era redondo.
Bem redondo mesmo.
Seus cabelos cacheados.
E no rosto sempre um riso fácil.

Hoje, ao ver meu vizinho, seu filho do meio, pintando o portão, imaginei o ‘Sr’ Vicente ali ao lado do filho, sorrindo.
Anjo moreno, agora com asas.
Meu coração se encheu quando eu consegui ouvi-lo dizer:
“- Vamos menina, vamos, é só uma brincadeira!”
Sorri.
Meus lábios quase se abriram em resposta, mas achei melhor não assustar as pessoas falando com quem já não se vê entre nós.
Em silêncio respondi:
_ Eu prometo que vou, ‘Seu Vicente’. Prometo que não vou esquecer que isto aqui não passa de uma grande brincadeira.

Sai de casa jurando brincar como uma criança todas as vezes que me permitirem.
- E quando não permitirem, ‘Seu Vicente’, prometo fazer bagunça, muita bagunça

quinta-feira, 29 de março de 2012

Nação estuprada.



Eu nasci em meio à ditadura.
Cresci ouvindo o nome desta megera deformadora de almas que não era personagem de ficção.
Ela tinha nome e usava farda.
Lembro de meu pai falando dela, de seus gestos eloqüentes e indignados, quando falava de um ou outro amigo desaparecido.
Cresci sem entender um Estado que deveria nos proteger, todavia, canalhamente, torturou, estuprou e matou civis.
Era assim que eu via, era isto que eu entendia da tal ditadura.
De tempos em tempos eu ouvia noticias de que meu pai andava escrevendo coisas que poderiam prejudicá-lo.
E um pouco do medo dele se tornava meu também.
E eu nem sabia o que ele fazia de “errado”.
Era um medo que nascia sem que eu soubesse onde era seu berço.
Ouvia meu pai falando de amigos, anônimos, que sumiram, outros que pela tortura enlouqueceram.
Lembro de seus olhos marejados, a boca fechada em angustia, as mãos fechadas em dor.
Fantasma assustador era a tal ditadura.
Ela escondia pessoas e depois as devolvia, loucas, aleijadas, destruídas.
Ou ainda, jamais as devolveria...
As pessoas eram presas, e sob a tutela do Estado, desapareciam.

A ditadura matou, torturou e destruiu não só o individuo que levou sob o peso de sua mão.
Ela fez isto com os familiares de cada pessoa morta, torturada ou desaparecida.
Toda a família era despedaçada, e ainda é, mil vezes, sob o peso da injustiça.
Não quero imaginar o que é ter um(a) filho(a), um(a) irmão(ã), o(a) esposo(a) desaparecido(a).
Andar pelas ruas em uma vã esperança de tudo ter sido um pesadelo medonho e que, um dia, teu amor regressará.
Desaparecer na ditadura é deixar para quem procura a certeza da morte e a dor de nunca dizer adeus.
Não podemos seguir adiante sem jogar luz sobre este passado tão recente e que muitos querem que permaneça no escuro.
Precisamos juntar nossa voz em um só clamor pelo desarquivamento dos arquivos da Ditadura e pela revisão da Lei de Anistia.
O meu grito é o grito anônimo.
Não entendo de leis, mas me causa assombro uma lei ser usada para livrar assassinos e torturadores.
Quando menina a Lei da Anistia soava aos meus ouvidos como canção libertadora, hoje sinto que ela nivela vitimas e algozes.
Seqüestro, tortura e assassinatos cometidos sob a proteção do Estado não podem ser crimes políticos.
Torturadores não podem andar sorrindo livremente enquanto famílias inteiras foram despedaçadas. Isto não pode se repetir.
A luta para que o passado não caia no esquecimento não pode ser somente dos familiares e das vitimas.
Hoje nossa voz deve ser a voz de todo um povo.
É urgente a criação de um mecanismo, uma norma, que não permita que o Estado anistie seus próprios agentes.
Permitir o esquecimento dos crimes de seqüestro, tortura e assassinatos nos anos da Ditadura é o mesmo que permitir que o Estado estupre toda nossa nação, novamente, sob a sombra da lei.

Este texto faz parte da 5ª Blogagem Coletiva #DesarquivandoBR

http://desarquivandobr.wordpress.com/2012/03/18/convocacao-da-5a-blogagem-coletiva-desarquivandobr-3/

"Nossa luta é por justiça e pela preservação da memória. Para que se conheça, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça."

quarta-feira, 28 de março de 2012

E se ?

(Este texto é mais um dos rabiscos de outono)


E se?
Se um dia, loucos e vadios, desistirmos da postura séria e dos compromissos éticos e assim, desnudos de aparências nos jogarmos na boca, um do outro?
Este envolvimento não terá nome.
Não terá nome, mas terá hora.
Horas de esquecimento físico, totalmente entregues ao sabor dos nossos corpos, e de alguns versos, que diremos rindo, bêbados de poesia.
Ah, se perdermos o chão, e jogarmos longe toda prosa, ficarmos só eu e você, no tato, descobrindo o que não se pode ver?
E ai? Que importância fará?
Não muda nada.
O céu continuará sendo céu, a serra continuará sendo serra, a vida pra ganhar custará tanto quanto antes.
Em um tapa aos bons costumes não fará importância alguma se não ligares no dia seguinte, e não será preciso explicar nada, só será necessário grudar sua pele lisa no meu rosto e pedir de novo o que já te dei noutro dia.
Só vinho, musica poesia e sexo.
E sem nenhum problema em ser assim.
Se perdermos a compostura, e brincarmos algumas horas de não sermos ninguém?
Sermos bichos, sermos personagens, sermos crianças sem nome.
Minha coxa lisa em seus cabelos desalinhados.
Sua boca úmida em minha pele quente.
Minha boca quente em sua pele úmida.
Compasso, ritmo, risos.
Sem nomes, sem rótulos.
...e se?
Se, seria.
Se, faria.
Se, daria.
Se...



quinta-feira, 8 de março de 2012

Mulher, gente e ponto!

Eu não ia escreve nada sobre o dia internacional da mulher, mas diante do tanto de marmanjo chorão com que eu me deparei hoje sou obrigada a meter minha colher neste caldeirão de mensagens e textos que temos hoje.
O que tem de homem indignado com o dia da mulher não é brincadeira.
E o comentário que mais ouvi foi de que deveria ter o “dia do homem ” também.

Meninos, parem de birra!
Se vocês querem colo é só falar que a mulherada dá.
Alias damos colo, damos abrigo, damos o sangue, damos a vida e o mais que precisarem.

O que está em questão não é um dia para homenagear as mulheres.
Esta data é um dia para refletir sobre a luta por igualdade.
Veja bem meninos, foi preciso muita luta para que a mulher conseguisse o direito de ser Gente.
Gente e ponto. É só isto que queremos.
Não queremos ser mártires, nem musas, nem rainhas...só queríamos ser gente e como tal ter seus direitos preservados.
Direito a vida e a livre manifestação de Ser.

Quando mencionei que esta data relembra as operárias que foram mortas em uma fábrica ao lutar por seus direitos, o balconista do restaurante onde almocei alegou que milhares de homens morrem em guerras e nem por isto tem um dia para eles.
Estes morrem pela causa, seja ela justa ou não, mas é pela causa.
Não morrem simplesmente por serem homens.

Mulheres são mortas, algumas vezes ainda no ventre, só por serem mulheres.
Por séculos as mulheres foram impedidas de aprender a ler e escrever simplesmente por serem mulheres.
Mulheres são humilhadas, agredidas, estupradas e mortas por serem vistas como um objeto ao prazer de certos tipos de homens.
Mulheres, a despeito de sua capacidade, muitas vezes são remuneradas com salários menores, simplesmente por serem mulheres.
Mulheres não tinham direito ao voto, só por serem mulheres.
Entendem? O argumento é: não pode, pois é mulher!
Ou então: não pode, não vai, não deve, pois é “minha mulher”!
Ou ainda não quero, pois é mulher!
Percebem?

Meninos parem de birra!
Acreditem, tudo o que queremos é não precisar de um dia para lembrar a sociedade de que somos gente, tão gente como vocês do outro gênero, e não abrimos mão disto!

Por hora é só...
E feliz dia das mulheres!

sexta-feira, 2 de março de 2012

Alice

De todas as maneiras de amar, não há outro jeito que eu possa entender, do que assim, doendo, doar.
Não me pergunte o que sinto ao te amar, mas só posso sentir que o mundo começa e termina neste seu olhar.
Se soubesse que doeria tanto, eu escolheria não te amar, não deste jeito tão desmedido.
Parte de mim, menina minha, por que saíste de mim e e as vezes me roubas teu olhar?

Pequena e frágil que eras, medo de quebrar-te ao meio, hoje medo de quebrar meu peito
Se no meu peito parte maior é tua, se ao parir me tornei maior, melhor, se os teus olhos são como os meus, o que posso fazer?
Você tem seu destino a frente, um universo onde não quero dominar.

Quero uma pequena parte do mundo que será seu, quero meus olhos nos teus olhos.

Quero tua lembrança doce no findar da lida quando lembrar que me teve por mãe, quero um sorriso nos lábios quando pensar em mim, quero que me tenhas um amor que não seja um fardo, e que este amor que me consome seja uma chama benéfica dentro do teu peito, a te aquecer por toda a sua vida.

Filha, Feliz Aniversário.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Fome.

Ele se enrosca em um canto do quarto e espera que passe logo.
Mas não passa.
A agonia que o consome devora sua mente, produz sensações que vão da tristeza a dor, em poucos instantes.
Dói. Dói o peito, dói a alma envelhecida antes do tempo, dói a falta do leite, o leite quente que aqueceria seu corpo pequeno.
Mas o calor não vem, e o corpo se ressente.
Frio. Mais frio do que pensou que podia suportar.
E aquele ar pesado, que consome tudo ao seu redor.
A luz do quarto sendo acessa lhe faria pensar que alguém está chegando.
Mas ninguém chega.
Aquela dor tem nome, agora ele sabe, é fome.
Fome. Fome que humilha seus sentidos e o faz sentir-se como um verme.
Queria ser um cão.
Um cão, ainda que sem dono, mendiga, sem vergonha, um pão que lhe alimente.
Mas ele não. Ele tem vergonha de mendigar.
Vergonha de sua fome.
Vergonha de seus braços tão pequenos que nada produzem, ainda.
Vergonha de seus cabelos, sempre lavados com sabão.
Vergonha de suas roupas sempre encardidas.
Vergonha das unhas, que não sabe cuidar.

Vergonha de ser gente e de querer ser um cão.

Naquela hora, ele sente fome e frio.
Não há outra sensação que possa lhe alcançar.
Ele fica quieto e dorme.
Dorme.
Irá passar durante o sono.
Ou quem sabe irá acordar e no meio do quintal o estará esperando o boneco que pediu no Natal?
...ele é gente e queria ser cão. E sendo cão, queria não mais acordar.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Segredos de menina.

Eu era só uma menina, e era bom.
Os prazeres eram simples,os contatos suaves, e as descobertas constantes.
Éramos um grupo de 10 crianças, todos da vizinhança, entre meninos e meninas.
Brincávamos muito de "esconde-esconde", sabe né? Um grupo se esconde, enquanto um tem a missão de procurar. O primeiro a ser encontrado começa tudo de novo.
Nesta fase já começam a despertar os primeiros interesses pelo sexo oposto (ou não, vai de cada um) e quase sempre na hora de esconder procurávamos ficar perto de quem nos interessava.

Uma tarde eu me enfiei em um canto, atrás de uma pilha de pneus gigantes.
O garoto mais interessante da turma veio se esconder ali também.
Ficamos pertos o suficiente para eu sentir o calor do corpo dele, misturar ao meu.
O peito dele tocava minhas costas e eu podia sentir sua respiração em minha nuca.
Parte do braço dele tocava o meu.
Silêncio.
Só o cheiro dele e seu toque, sutil. O resto todo havia sumido.

Logo os amiguinhos foram sendo encontrados, mas nós dois ficamos ali, imóveis, fingindo não perceber que já era hora de sair.
Eu, imaginando se ele estava sentindo o mesmo que eu, aquele desfrute inocente do corpo do outro.
Subitamente, o gesto:
Virei o corpo lentamente, fiquei na ponta dos pés e lasquei um beijo, em seus lábios.
Não fiquei para perceber a reação, sai correndo, rindo.
Depois ficou aquele olhar cúmplice, de um segredinho só nosso, sempre que brincávamos de esconde-esconde, dávamos um jeito de nos esconder juntos...nunca mais houve outro beijo, mas ambos sabíamos o quanto era bom sentir o contato, ainda que vago, do corpo do outro. E nos bastava isto:
O calor, o cheiro, o leve roçar dos braços e o tempero fundamental: era o nosso segredo, inocente e saboroso.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Para não esquecer...

Durante as férias, uma de minhas importantes atividades foi o ócio.
Costumam dizer que ele é criativo.
Sei lá.
Meu ócio foi contemplativo.
Mas pude chegar a algumas conclusões, que de tão obvias, assustam, pela quantia de vezes que as esqueci.
Divido, algumas destas conclusões, com vocês meus amigos:

1º Quando se trata de nossos pais, os 100 anos sempre serão poucos.
Não me digam que 70 anos é velho. Não para minha Ana Klas.

2º Moramos perto do litoral. Devemos lembrar disto sempre, mesmo no meio do metrô lotado.
Poucas coisas na vida são tão maravilhosas quanto um bom mergulho no mar. Um só dia vale a pena. Não é preciso esperar por feriados, ou mil planos. Oito horas jogada na areia fizeram milagres por mim.

3º Dormir é bom. Dormir é muito bom. Mas a vida passa enquanto dormimos demais.
Vontade de acordar é fundamental para ter vida com qualidade. A vida só acontece quando estamos acordados.

4º Os filhos podem ser o motivo que nos falta, para quase tudo de bom que devemos fazer na vida. Mas não para tudo. Duas ou três coisinhas devem ser feitas por puro egoísmo.

5º Quando fizer um evento importante, do qual queira uma bela recordação, nunca, em hipótese alguma postergue a contratação de um bom profissional. Não confie nem mesmo em seu melhor amigo para tirar as fotos...

Por hoje é só.
Beijos
Eliana Klas.

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