quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Fome.

Ele se enrosca em um canto do quarto e espera que passe logo.
Mas não passa.
A agonia que o consome devora sua mente, produz sensações que vão da tristeza a dor, em poucos instantes.
Dói. Dói o peito, dói a alma envelhecida antes do tempo, dói a falta do leite, o leite quente que aqueceria seu corpo pequeno.
Mas o calor não vem, e o corpo se ressente.
Frio. Mais frio do que pensou que podia suportar.
E aquele ar pesado, que consome tudo ao seu redor.
A luz do quarto sendo acessa lhe faria pensar que alguém está chegando.
Mas ninguém chega.
Aquela dor tem nome, agora ele sabe, é fome.
Fome. Fome que humilha seus sentidos e o faz sentir-se como um verme.
Queria ser um cão.
Um cão, ainda que sem dono, mendiga, sem vergonha, um pão que lhe alimente.
Mas ele não. Ele tem vergonha de mendigar.
Vergonha de sua fome.
Vergonha de seus braços tão pequenos que nada produzem, ainda.
Vergonha de seus cabelos, sempre lavados com sabão.
Vergonha de suas roupas sempre encardidas.
Vergonha das unhas, que não sabe cuidar.

Vergonha de ser gente e de querer ser um cão.

Naquela hora, ele sente fome e frio.
Não há outra sensação que possa lhe alcançar.
Ele fica quieto e dorme.
Dorme.
Irá passar durante o sono.
Ou quem sabe irá acordar e no meio do quintal o estará esperando o boneco que pediu no Natal?
...ele é gente e queria ser cão. E sendo cão, queria não mais acordar.

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